terça-feira, 30 de abril de 2013

5 Segundos



Contemplava aquele sono tranquilo, que possuía uma beleza única e encantadora...
Apenas 5 segundos... 
Foi o tempo entre abrir a porta, perceber que a sala estava ocupada e fechá-la novamente. E ainda assim ele percebeu que a “menina” que estava sendo entrevistada na sala em que, momentos antes, ele estava usando para analisar projetos, era “interessante”. 
O trabalho novo era desafiador e gratificante. Teve a sorte de conseguir contratar uma equipe que já conhecia, e isso facilitava muito as coisas em uma empresa nova. Todos os integrantes, além de ótimos profissionais, eram amigos queridos, que haviam crescido profissionalmente junto com ele à duras penas, dentre eles um grande amigo de infância e padrinho do seu filho. Bem empregado, recém-divorciado, inteligente... Era difícil o dia em que ele não conseguia uma paquera nos bares da vida. E ele estava adorando aquela vida, pensou consigo mesmo várias vezes, que por ele, nunca mais deixaria de ser solteiro...
Um dos benefícios de se trabalhar em uma empresa grande, era de se ter transporte para o local de trabalho, isso além de facilitar a diminuição do absenteísmo, proporcionava um tempo de descanso para os trabalhadores, devido a grande distância entre o local de trabalho e a cidade. Estavam ele e seu grande amigo, no ônibus da empresa conversando sobre seus interesses em comum, ora falavam sobre o trabalho, ora sobre música (ambos tocavam violão), quando chegaram a um ponto em que todos precisavam descer do transporte para verificação de identidade funcional... Então ele a viu. Aquela “menina interessante” que vira uns dias atrás apenas por uns segundos. Agora podia analisar atentamente e percebeu que ela era ainda melhor do que podia se lembrar, era “o seu número” e devido a enorme cumplicidade que possuía com seu amigo, precisou apenas olhar para que ele percebesse que havia se interessado, seu amigo realizou um movimento de arquejo com as sobrancelhas sinalizando que havia entendido a mensagem.
A nova funcionária morava na mesma rota que ele, e por isso utilizava o mesmo transporte para ir ao local de trabalho. Todos os dias aguardava o momento em que ela descia do transporte para poder admirar suas formas.
Tentou a aproximação com um argumento qualquer, passaram a almoçar juntos e conversar sobre os mais diversos assuntos no transporte e  o contato resultou em uma “amizade” inesperada, e isso não o agradou. Sentia-se bem ao conversar com ela, contanto casos durante a viagem de ida e volta, mas ao mesmo tempo, pensava que estava sendo desonesto com ela, ao demonstrar fraternidade, quando na verdade seu interesse era outro. Aproveitando um dia de sábado em que fariam jornada extraordinária e o efetivo era bem menor, ele abriu o jogo. Disse tudo o que estava querendo com relação a ela, expôs seus desejos, como ele imaginou que seria, prontamente alegou que aquilo era uma loucura, pelo fato de que ela era casada, e por ela nunca ter se insinuado dessa maneira. Ele concordou, e disse que não acreditava que algo fosse acontecer entre os dois, mas que achava canalhice o fato de estar posando de amigo, quando na verdade a intenção era lhe dar uns amassos.
E a vida seguiu... Continuavam almoçando juntos e conversando muito no caminho de ida e volta do trabalho. Ele apresentou livros e discos de que gostava e, para sua surpresa, ela acabou gostando também. Por conta dessa “amizade” ele pôde agradecê-la por alguns flertes que somente foram possíveis graças às suas dicas, dizendo qual das meninas se interessava por ele, já que ele admitiu por várias vezes não possuir a percepção necessária para saber quando alguém o olhava com segundas intenções. Mas ouvir no banheiro feminino as histórias do que ele fazia ou deixava de fazer foi causando certo aperto no peito da menina, aperto esse que ela não sabia explicar. Não sabia se era por conta dos problemas pessoais que vinha enfrentando, como a crise no casamento, ou porque queria muito bem àquele novo amigo, estranhava quando sentia a falta dele nos fins de semana. Pensou se era porque se divertia tanto ouvindo os contos de suas aventuras noturnas que sentia falta da época em que era ela a protagonista destes contos.
Ele percebeu que algo mudara... Não sabia o quê, mas algo mudara... Certa vez, por conta de um atraso na saída do trabalho, a noite já estava alta, e os dois conversando no transporte, ele percebeu que ela exibia certa fragilidade, um olhar de quem quer ter a vida sacudida, e ele não pensou duas vezes, como costumam dizer por aí “o não é certo, o que vier, além disso, é lucro”. Aproximou-se dela, e quando fez isso sentiu que ela se arrepiou, e a respiração ficou mais pesada, colocou a mão em seu rosto virando-o levemente em direção a ele, os lábios estavam em perfeito alinhamento... Quando partiu com seus lábios em direção aos dela, pôde ver que ela não relutou, mas ao invés disso fechou os olhos e suspirou como quem aguarda uma dádiva...
Hoje, quase cinco anos depois ele contempla esse sono tranquilo e encantador, a “menina interessante”, dorme tranquila abraçada com uma linda criança que veio completar a felicidade dos dois. E contemplando esse sono ele se lembra de tudo o que aconteceu nesse período e pensa... “ 5 segundos podem mudar uma vida”.